Um dos sentimentos mais comuns da experiência humana, a timidez pode ter muitos significados e causas. Vamos dar uma olhada sobre como a psicanálise olha para este fenômeno? Então vem com a gente!
O papel da vulnerabilidade
Embora algumas pessoas procurem esconder suas vulnerabilidades psíquicas e sociais, elas são a base para a elaboração singular de experiências que são negadas como fatos históricos ou culturais, ou ainda, que são desautorizadas ou tornadas indiferentes pelo Outro, constituindo-se assim como traumáticas. Assim, a psicanálise trabalha na transformação das relações de poder, bem como na subversão do silenciamento proveniente de cenários nos quais a angústia e a vergonha são os afetos predominantes.
A timidez na psicanálise
Um traço considerado comum na personalidade humana, a timidez pode se manifestar em sintomas somáticos, cognitivos e comportamentais. Atualmente, sua prevalência na população mundial é de mais de 70%, não sendo, no entanto, considerada uma patologia.
A timidez ao falar um público, por exemplo, pode levar a sintomas somáticos como rubor facial, tremores, palpitação e boca seca. Sintomas cognitivos como a antecipação de possível avaliação negativa pelo outro em situações sociais podem levar a comportamentos de inibição, retraimento e evitamento de situações sociais, dentre elas a de falar em público.
O ato de falar em público
A fala em público traz consigo aspectos não verbais observados pela voz, ritmo de fala, gestos ou expressões faciais que influenciam diretamente o discurso e fornecem sentido ao que se diz. No entanto, estudos mostram que a timidez reduz a expressividade da fala em público. Pessoas tímidas geralmente apresentam aspectos não verbais de comunicação alterados tais como a falta de projeção da voz, volume de voz reduzido, velocidade de fala acelerada, falta de contato visual com o interlocutor, gestos contidos, retraídos e postura tensa. O sujeito que se queixa de timidez fornece elementos importantes em psicanálise para o estudo de questões narcísicas relacionadas à problemática do olhar e às formas de dependência.
Inibição na psicanálise
Na psicanálise, a inibição é considerada um mecanismo de defesa. Os mecanismos de defesa são operações de natureza psíquica empreendidas pelo indivíduo para defender-se de uma angústia interna, seria uma luta do ego contra idéias ou afetos dolorosos ou insuportáveis. Assim, os métodos defensivos descobertos pela análise tem o objetivo de auxiliar o ego na luta com sua vida instintiva. Segundo Freud, a inibição está relacionada à função e não tem implicação patológica.
Vergonha e embaraço
Segundo estudos, o embaraço é considerado a vertente menos intensa e judicativa do universo semântico da vergonha, e consiste na sensação de desconforto que ocorre quando alguém se sente exposto. Se relaciona com sofrimentos relacionados com toda a trama relacional da exposição, tal como estar na posição de objeto, não ter controle sobre o que está sendo visto, sofrer as consequências da passividade diante do outro, suportar com dor a reflexividade própria a relação com o olhar do outro, entre outros fatores. Assim, o desconforto com a exposição é um aspecto comum entre a vergonha e o embaraço.
Ser observado pelo outro
O simples fato de se sentir objeto do olhar de outro pode produzir sofrimento, mesmo que o olhar alheio não traga um juízo negativo. O sujeito tímido procura permanentemente antecipar o perigo do julgamento negativo e, assim, do desprezo alheio através de uma forma particular e crônica de angústia. De forma contrária, o permanente embaraço se tornaria uma vergonha inconsolável já que, em comparação com a vergonha, do ponto de vista moral o embaraço não ocupa um papel relevante. A vergonha é um passo adiante do embaraço, já que aí ser objeto do olhar de outrem equivale a ser objeto de desprezo de outrem. Essa é uma realidade que afeta significativamente a saúde mental e a qualidade de vida do indivíduo que sofre com o olhar alheio temendo punição ou exclusão.
O embaraço
Autores psicanalíticos relatam que o embaraço é uma forma antiga da experiência da vergonha, um momento de intersecção da consciência da própria perceptibilidade e embaraço como sofrimento produzido pela exposição. Assim, o embaraço testemunha o que não é assimilável como perfeição narcísica no desenvolvimento do indivíduo. O processo de separação da alteridade consolida a estabilização narcísica, no entanto, o perigo de ser “mal visto” leva o olhar alheio a ser conjugado de outras formas, deixando de ser objeto de estima do outro. O ambiente tem papel fundamental para que estes perigos não sejam negados, ao menos como perigos potenciais, mas também não se tornem ameaçadores a ponto de paralisar o infante no seu gesto espontâneo.
A vergonha como sinal
A vergonha pode ser um sinal de alarme, alertando para o risco de perda de amor do objeto (outro). A vergonha veicula a memória afetiva das falhas parciais de afinação entre o sujeito e seu ambiente, ao mesmo tempo que se faz uma saída possível para se apoiar nesse mesmo ambiente. É a vergonha que atua como sinal de alarme para os fracassos parciais de aprendizagem da higiene, do controle esfincteriano e de todas as falhas da continência corpora, que deixam inevitáveis feridas narcísicas não tratadas ao longo do tempo, motivação para os comportamentos de timidez e inibição.
“Sintomas” da timidez
O indivíduo com sentimento de vergonha e timidez nas relações sociais costuma chegar à clínica com esta principal queixa. Relatam não gostarem de andar de ônibus ou na rua, possuem um temor de que pensem negativo a seu respeito, embora não saiba dizer muito bem o que elas possam pensar. Suas fantasias quanto ao olhar do outro podem apresentar caráter persecutório, mas estas são pouco elaboradas. É frequente que esses sujeitos tenham poucas lembranças de infância, não conseguindo relatar quando sentiu-se assim pela primeira vez. Este sofrimento é a marca de uma relação com o objeto construída sobre a impossibilidade de prescindir de seu olhar. Estar longe (geralmente do olhar materno) é considerado estar em perigo para a psicanálise. Um perigo desconhecido quanto à sua fonte e seu modo de operar. As estratégias criadas para tornar a vida suportável são: permanecer em estado de alerta (vivido como embaraço) ou estar ao abrigo do olhar privilegiado já descrito.
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Referências:
MARINHO, A.C.F. et al. Autopercepção de timidez e sua relação com aspectos da fala em público. CoDAS. 2020;32(5).
VERZTMAN, J. Embaraço, humilhação e transparência psíquica: o tímido e sua dependência do olhar. Ágora. 2014;17.
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